segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Riscos de uma Especialização Precoce

Riscos de uma Especialização Precoce
Wilton Carlos de Santana
Mestre em Pedagogia do Movimento pela UNICAMP (SP)
Doutorando em Educação Física na UNICAMP (SP)

Observo que a especialização precoce é um tema sedutor para grande parte dos alunos de Educação
Física. Assim sendo, contribuirei neste texto com algumas reflexões sobre esse fenômeno.
Não preciso ir muito longe: encontrar-se-á em vários autores (Bompa, Gallahue, Greco) a dica de que o
aprendizado de um único tipo de esporte coletivo deve se iniciar a partir dos 10, 11 anos de idade. Isso,
pelo menos, por quatro motivos: (1) as habilidades básicas estão afirmadas, o que facilita aprender
habilidades específicas, (2) a criança, quando joga, consegue descentrar-se e, por isso, jogar coletivamente
(socializar as suas habilidades), (3) há uma maior capacidade de concentração, (4) caminha-se para o
pensamento formal, fundamental para o aprendizado tático. Estas, e outras coisas, certamente facilitam
aprender um jogo complexo como o coletivo.
Portanto dos 5,6 aos 9,10 anos em média, deve-se aprender coisas diversificadas. Por conseguinte, em se
tratando de futsal, estamos com sérios problemas. Por quê? Porque boa parte das crianças se inicia antes
dos 10 anos. Então o problema é a idade que se inicia? Não e sim. Não se a pedagogia der conta de tratar
o esporte de tal forma que os conteúdos da aula convergiam com o nível de desenvolvimento da criança
(que estes sejam tanto mais diversificados quanto possível), se os adultos criarem menos expectativas
sobre o resultado quando da disputa de jogos e se o tipo de competição em que se inscrevem as crianças
favorecer a auto-estima. Sim se a pedagogia abrir mão disso.
Em outras palavras: se a pedagogia conduzir a criança a se especializar na execução de determinadas
técnicas, em jogar numa posição em particular, a treinar mais de três vezes por semana, a ser qualificada
como reserva ou como titular (e a jogar menos ou mais por isto), a prescindir do lúdico (deixar de brincar), a
competir formalmente, o problema passa a ser a idade, pois todas essas coisas, e outras como o
imediatismo, são precoces.
Logo, inserir crianças pequenas no futsal faz sentido se as aulas contemplarem, além de vivências das
habilidades específicas (e eu não disse aprimoramento técnico), a vivência de habilidades básicas, de
atividades diversificadas, o jogar em diferentes posições e, às vezes, sem guardar posições, a freqüência
semanal máxima de três vezes (duas aulas e um encontro [jogo]), a participação de todas as crianças
independentemente do seu nível de desenvolvimento, a vivência de brincadeiras e de jogos (pois estes
despertam o interesse e este é o combustível da inteligência), a fomentação de um ambiente sócio-moral
cooperativo (de trocas sociais) e um ambiente livre de pressões e expectativas.
Diria que aprender muito sobre pouco (especialização) não é coisa para criança. Aprender coisas novas
(diversificação) sim.
Aliás, a especialização precoce é muito perigosa. Dissimulada, pode ser que não revele imediatamente
problemas, isto é, pode ser que a criança de 6 anos sinta a conseqüência de um treinamento inadequado
apenas aos 12!
O que eu escrevi até o momento interessa para o professor comprometido socialmente. Para quem se
interessa em alcançar resultados em curto prazo é "café-com-leite". Para esses pseudoprofessores, importa
apenas o pseudoprestígio que pensam alcançar com parte dos pseudodirigentes e dos pais quando as
cinco crianças que escalam para jogar vencem o jogo e o campeonato. Tem gente que quer ser campeão
do mundo com crianças de 7 e 8 anos! Isto é antipedagogia! É um dos fatores que fomenta ainda mais,
entre pais e dirigentes esportivos, a crença de que especializar antes do tempo é adequado e que é este o
caminho para se alcançar resultados expressivos. Isto é postura de professor de Educação Física que
cabulou aulas na Universidade!

Fonte: www.pedagogiadofutsal.com.br
Abraço.