Riscos de uma Especialização Precoce
Wilton Carlos de Santana
Mestre em Pedagogia do Movimento pela UNICAMP (SP)
Doutorando em Educação Física na UNICAMP (SP)
Observo que a especialização precoce é um tema sedutor para grande parte dos alunos de Educação
Física. Assim sendo, contribuirei neste texto com algumas reflexões sobre esse fenômeno.
Não preciso ir muito longe: encontrar-se-á em vários autores (Bompa, Gallahue, Greco) a dica de que o
aprendizado de um único tipo de esporte coletivo deve se iniciar a partir dos 10, 11 anos de idade. Isso,
pelo menos, por quatro motivos: (1) as habilidades básicas estão afirmadas, o que facilita aprender
habilidades específicas, (2) a criança, quando joga, consegue descentrar-se e, por isso, jogar coletivamente
(socializar as suas habilidades), (3) há uma maior capacidade de concentração, (4) caminha-se para o
pensamento formal, fundamental para o aprendizado tático. Estas, e outras coisas, certamente facilitam
aprender um jogo complexo como o coletivo.
Portanto dos 5,6 aos 9,10 anos em média, deve-se aprender coisas diversificadas. Por conseguinte, em se
tratando de futsal, estamos com sérios problemas. Por quê? Porque boa parte das crianças se inicia antes
dos 10 anos. Então o problema é a idade que se inicia? Não e sim. Não se a pedagogia der conta de tratar
o esporte de tal forma que os conteúdos da aula convergiam com o nível de desenvolvimento da criança
(que estes sejam tanto mais diversificados quanto possível), se os adultos criarem menos expectativas
sobre o resultado quando da disputa de jogos e se o tipo de competição em que se inscrevem as crianças
favorecer a auto-estima. Sim se a pedagogia abrir mão disso.
Em outras palavras: se a pedagogia conduzir a criança a se especializar na execução de determinadas
técnicas, em jogar numa posição em particular, a treinar mais de três vezes por semana, a ser qualificada
como reserva ou como titular (e a jogar menos ou mais por isto), a prescindir do lúdico (deixar de brincar), a
competir formalmente, o problema passa a ser a idade, pois todas essas coisas, e outras como o
imediatismo, são precoces.
Logo, inserir crianças pequenas no futsal faz sentido se as aulas contemplarem, além de vivências das
habilidades específicas (e eu não disse aprimoramento técnico), a vivência de habilidades básicas, de
atividades diversificadas, o jogar em diferentes posições e, às vezes, sem guardar posições, a freqüência
semanal máxima de três vezes (duas aulas e um encontro [jogo]), a participação de todas as crianças
independentemente do seu nível de desenvolvimento, a vivência de brincadeiras e de jogos (pois estes
despertam o interesse e este é o combustível da inteligência), a fomentação de um ambiente sócio-moral
cooperativo (de trocas sociais) e um ambiente livre de pressões e expectativas.
Diria que aprender muito sobre pouco (especialização) não é coisa para criança. Aprender coisas novas
(diversificação) sim.
Aliás, a especialização precoce é muito perigosa. Dissimulada, pode ser que não revele imediatamente
problemas, isto é, pode ser que a criança de 6 anos sinta a conseqüência de um treinamento inadequado
apenas aos 12!
O que eu escrevi até o momento interessa para o professor comprometido socialmente. Para quem se
interessa em alcançar resultados em curto prazo é "café-com-leite". Para esses pseudoprofessores, importa
apenas o pseudoprestígio que pensam alcançar com parte dos pseudodirigentes e dos pais quando as
cinco crianças que escalam para jogar vencem o jogo e o campeonato. Tem gente que quer ser campeão
do mundo com crianças de 7 e 8 anos! Isto é antipedagogia! É um dos fatores que fomenta ainda mais,
entre pais e dirigentes esportivos, a crença de que especializar antes do tempo é adequado e que é este o
caminho para se alcançar resultados expressivos. Isto é postura de professor de Educação Física que
cabulou aulas na Universidade!
Fonte: www.pedagogiadofutsal.com.br
Abraço.