quinta-feira, 22 de abril de 2010

Pensar fazendo, fazer pensando

Por João Batista Freire

Por último, quero falar de um dispositivo, observável especialmente em alguns grandes atletas que caracterizam uma determinada maneira de ser inteligente no esporte. Mais forte que minhas palavras seria mostrar as ações de um atleta, como o americano Magic Johnson, do basquetebol. Ao decidir-se por uma jogada, ele realizava com tanta precisão e rapidez o que pretendia, que era difícil dizer se estava pensando no que fazia enquanto executava a ação.
Vou mencionar de memória o que li do técnico americano de basquetebol Phill Jackson, pois não tenho à mão o seu livro Cestas Sagradas. Ele afirma que, ao se decidir pela jogada, o jogador deve parar de pensar, deve jogar. O observador desavisado poderia interpretar mal essas palavras, pois Jackson não propõe que o esporte seja praticado sem pensamento, mas traduz com perfeição a idéia de que o grande jogador funde de tal maneira pensamento e ação, que é impossível observar um destacado do outro.
Comparando jogadores iniciantes, ou maus jogadores, com grandes craques do esporte, pode-se verificar nos primeiros uma boa distância entre pensar e fazer ou, ao contrário, entre fazer e pensar. À medida que a qualidade desportiva cresce, o jogador diminui a distância entre as duas ações, até que elas praticamente se fundem. Nós, expectadores e críticos, temos todo o tempo do mundo para pensar o que foi feito em um jogo ou o que deverá ser feito no próximo jogo. Não há uma urgência nos cobrando uma realização imediata.
Acontece, porém, que as situações mais decisivas são sempre emergenciais. Uma cortada no voleibol, uma assistência no basquetebol, um chute a gol numa área cheia de zagueiros no futebol exigem ação extremamente rápida. E essa ação será tanto mais eficaz quanto mais inteligível for, mais bem coordenada, não apenas nos gestos motores entre si, como também entre eles e os pensamentos. É por isso que, dentro da área – o espaço mais vital do futebol -, Romário é um rei, o jogador mais inteligente do Brasil. Nele, pensamento e ação não se separam. Basta um átimo de tempo para ele decidir uma partida.
Essa forma de ser inteligente, tão presente em Romário e em vários outros craques da bola, é educável, como tantas outras formas específicas de inteligência, e, conseqüentemente, pode ser transferida a uma inteligência mais geral. Ora, para dar conta de problemas críticos, emergenciais, temos de fazer nossos alunos experimentarem situações emergenciais. Que a criatividade do professor seja capaz de utilizar-se do jogo para criá-las.
Há uma tradição em nossa civilização de não reconhecer inteligências não coincidentes com a inteligência do intelectual, do cientista. Por isso, para muitos, Garrincha, no seu tempo, era “burro”, quando, de fato, dentro do campo, naquele contexto, ele era o mais inteligente. Esse conceito opõe-se radicalmente à maneira de pensar de muitos técnicos, para os quais a inteligência deve ficar no banco, do lado de fora do campo, isto é, neles, ao passo que aos jogadores cabe participar apenas com o físico. A distância entre pensamento e ação torna-se, no caso, tão grande, que raramente algum jogador será capaz de realizar as ações que decidirão o jogo.

Abraços !!!